Muitas pessoas acreditam que a dependência ao crack ou óxi não tem volta. Ledo engano. O psiquiatra Marcelo Rocha, fundador da Clínica Clara de Assis, primeira residência assistida de Campinas, afirma que o tratamento é longo, podem acontecer recaídas, mas a recuperação é possível. Mas o tratamento só com medicamentos, não funciona.
“Eu tinha 18 anos quando comecei a usar mesclado – uma mistura de maconha com crack”, diz o estudante (24) que há 18 meses está "limpo". A maconha segura a fissura, mas dá uma ressaca brava, afirma. Para fugir da dor de cabeça resolveu fumar crack puro. Conta que os amigos já estavam usando e isso aguçou a curiosidade. “A sensação de euforia é indescritível, mas só dura enquanto se está fumando. Quando passa o efeito vem a depressão, paranóia, pânico, mau humor e você quer mais”.
Uma “alegria” tão curta tem um preço bem alto. Ele conta que chegou a gastar 200 reais em um dia de ‘viagem’. Abandonou a faculdade, saiu da casa da família em um bairro nobre e foi morar na favela. Tudo para ficar mais próximo das pedras. Só foi dormir depois de uma semana. Também perdeu o apetite a ponto de emagrecer 40 quilos.
“É certeza que os fornecedores acabam empurrando oxi no lugar do crack, mas o “barato” é tudo o que importa”, comenta. Depois de dois meses nesse ritmo, a mãe conseguiu negociar o início do tratamento. O estudante e a família estão há um ano e meio sob os cuidados do psiquiatra especializado em dependência, Marcelo Rocha.
COMPULSIVIDADE É O MAIOR
DESAFIO DO TRATAMENTO
Rocha diz que o grande problema tanto o oxi, como o crack, é que têm maior potencial de abuso que as drogas aspiradas ou digeridas. Isso porque, penetram no organismo pelos pulmões que por serem bastante vascularizados levam a um efeito imediato no cérebro. O consumo está crescendo no Brasil, inclusive entre pessoas mais velhas. avalia. “O óxi é a cara do jeitinho brasileiro de arrumar uma saída pra tudo”.
A fumaça tragada tem um efeito mais forte do que a cocaína aspirada ou injetada. Isso porque, explica, ativa mais o sistema de recompensa do cérebro relacionado à circulação de dopamina, neurotransmissor ligado ao prazer. “Como é a busca pelo prazer que nos move, isso explica porque quem usa uma vez quer repetir a dose”.
Por isso, ressalta o maior desafio do tratamento é conter a compulsão pelo óxi ou crack. O especialista diz que as duas drogas alteram o funcionamento do cérebro, destroem neurônios e são as únicas que levam à psicose imediata na primeira tragada. A diferença entre elas, destaca, é que o óxi tem efeitos mais devastadores sobre o organismo. Isso porque o maior número de sustâncias tóxicas adicionadas à pasta de cocaína causa mais alterações clínicas nos pulmões, circulação, sistema digestivo, neurônios e dentes. Mesmo assim, o tratamento só com medicamentos não funciona. Além do usuário necessitar de terapia para entender as perdas, os familiares se tornam codependentes. Significa que a preocupação e o excesso de cuidado com quem está usando a droga acabam adoecendo a família.
ALTERAÇÕES NOS FAMILIARES
Rocha diz que é comum os familiares se auto-anularem e até tomarem para si as responsabilidades da pessoa que se droga. Isso dificulta a recuperação e caracteriza a codependência. Outros sinais listados pelo médico são:
- Controle excessivo sobre o outro.
- Depressão
- Somatização da ansiedade sinalizada por dor de cabeça, dor nas costas, má digestão, problemas cardíacos e insônia.
- Baixa auto-estima, sentimento de culpa e vergonha.
Por isso, o tratamento tem que incluir a terapia familiar para ter resultado. E não é só isso. A família tem de ser treinada para funcionar como uma residência assistida em que os pacientes têm liberdade com responsabilidade. “Internações só são indicadas quando a pessoa representa um perigo para si mesma e para o outro”.
Para Rocha a única forma efetiva de conter o consumo de droga no Brasil é através do exame admissional e de manutenção periódica da saúde ocupacional. “Eu não acredito que alguém correria o risco de ser eliminado do mercado de trabalho para satisfazer a curiosidade. Esta é a melhor forma de fiscalizar as fronteiras”.
Fonte: Clínica Clara de Assis, Campinas -Eutrópia Turazzi
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