A cada 15 dias o Movimento Mães da Sé (Associação Brasileira de Busca e Defesa à Criança Desaparecida) se encontra nas escadarias da Catedral da Sé, realizando manifestação silenciosa com fotos e cartazes dos filhos desaparecidos.
"Somos irmanadas pela dor, a dor da perda, pela esperança de encontrar uma resposta. O desaparecimento é, infelizmente, uma causa invisível aos olhos da sociedade e das autoridades." É o que fala Ivanise Esperidião, presidente da organização, fundada em 1996 e que já encontrou 5,5 mil pessoas.
Sensibilizar a população, o Poder Público e as autoridades policiais para o drama de quem desapareceu, é o trabalho de sempre dessas pessoas. E reforçaram o apelo, figuras como a atriz Luana Piovani, Xuxa, Caco Ciocler, Luiza Possi, Bela Gil e Vitor Belfort, cuja irmã desapareceu em 2004 e até hoje não foi localizada
Dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) mostrram que os homens representam 62,8% dos desaparecidos; negros 54,3%. Além disso, crianças e adolescentes entre 12 e 17 anos são 30% dos desaparecidos.
Era 19 de setembro de 2013. Marta Castelo Branco Torres estava empregada, desempenhava um trabalho delicado, o de cuidar de crianças. Morava na capital paulista, enquanto uma das filhas, Eliene, de 36 anos, desapareceu, no município de Juquitiba (SP), na volta da igreja para a casa.
São Paulo - Dalia (irmã) e Marta (mãe de desaparecida).
Foto: Paulo Pinto/Agência Brasil
Eliene vivia com o marido e dois filhos. Segundo Marta, era uma mulher "bonita, uma senhora" e não tinha jamais sinalizado que pretendia fugir ou algo semelhante, especialmente porque amava muito suas crianças. Algo que fica em aberto até hoje é a dúvida sobre a participação de um genro no sumiço da filha, agredida dentro de casa. "Ela desapareceu um dia antes de assinar a separação", conta Marta, que não suportou mais trabalhar com crianças, por ter adoecido em diversas dimensões; hoje é costureira.
"Os policiais diziam: ela deve ter se cansado do marido e volta." Essa reação é bastante comum nos casos de desaparecimento. Quem não faz do sofrimento, minimiza o problema, tanto por parte de conhecidos como de autoridades que têm o dever de investigar o que de fato ocorreu. "Já dormi e acordei muitas vezes aqui na Praça da Sé."
Hilda Moisés da Conceição, de Desterro na Paraíba, veio a passeio a São Paulo para tentar espairecer, depois de completado um mês da morte do marido, e, por acaso, andava pela Praça da Sé quando viu a mobilização da campanha T-Search. A conexão com seu filho Edvaldo Ferreira de Vasconcelos, de 39 anos, foi cortada em 11 de dezembro de 2011. Ele vivia na capital paulista e viajou a São Miguel dos Campos, em Alagoas, com o primo. Então, sumiu.
"Ele disse que meu filho abriu a porta do carro e saiu correndo para o meio do canavial. É esse assunto até hoje."
"[O primo] É minha família, né. Então, fico sem resposta," após longa pausa e um suspiro. "Meu filho não era louco, só bebia. Se aconteceu isso... Só iam eles dois. Aí, a única versão é a do rapaz, primo dele. Eu pergunto a Deus. Ele continua contando a mesma história."
O irmão de Edvaldo, Eberaldo, comenta que registraram boletim de ocorrência, mas que foi em livro, não em sistema informatizado, embora o ano fosse 2011.
"O CPF dele está ativo. Se foi morto, ninguém achou. Toda eleição, eu levo o título dele e mando olhar para ver se ele votou. Nunca votou. Nem nunca fez compra em lugar nenhum," afirma Hilda.
Ao estar diante da outra filha da paraibana, Maria do Socorro Ferreira de Vasconcelos, também se pode constatar como a falta de explicações desorienta e, em certos casos, reorienta as pessoas próximas do desaparecido ou desaparecida. "Ele não tinha problema com a família. Por que não achou o caminho de novo? Mas a esperança está viva. Devido ao vício, pode ter virado morador de rua. Depois disso, a gente começa a ver a situação de morador de rua com outros olhos. Até então, eu olhava, tinha dó, mas medo também, porque não sabe o motivo de estar ali. Agora comecei a olhar mais para ele."
Presente no lançamento, o cabo Cândido, da SOS Desaparecidos, da Polícia Militar de Santa Catarina, é um dos três profissionais que compõem a equipe e entregam tudo de si. Em entrevista à Agência Brasil, ele ressaltou que a forma como desenvolvem os trabalhos no dia a dia foi sendo aprimorada com o tempo. Um exemplo disso foi se reposicionar e ficar a postos na rodoviária local, por perceber que estar ali aumenta a chance de acharem alguém dado como desaparecido.
"Tudo isso ajuda na efetividade. Erramos bastante nesse caminho e com os erros a gente aprendeu", afirma Cândido.
São Paulo (SP) 30/08/2024 - Uma ação destinada à conscientizar a população sobre pessoas desaparecidas, foi
organizada na Praça da Sé. Foto: Paulo Pinto/Agência Brasil
O policial ressaltou, ainda, que o grupo especializado mantém parceria com o Ministério Público do Rio de Janeiro, que utiliza bem o Sistema Nacional de Localização e Identificação de Desaparecidos (Sinalid), fundamental para cruzamento de dados. Há também, na conjugação de táticas, a consulta de bases de dados do setor público, como as de agências de emprego.
"Em um dos casos, a família do desaparecido comentou somente depois de dois meses que ele havia dito, no dia em que sumiu, à mãe que aquela seria a última vez em que ela o veria. Ela também tardou a dizer que tinha acesso ao email do jovem", exemplifica.
"[A área de desaparecidos] É o único lugar em que a gente encontra uma pessoa morta e a mãe fica feliz. É muito pesado. As pessoas não têm noção do que é o desaparecimento. Por isso que quem trabalha lá é muito empenhado. O pessoal acha que vai para o setor e vai ficar tranquilo. Não é assim. É muita carga de trabalho e só fica quem realmente se identifica e se empenha", diz o cabo.
Familiares de classes mais altas, pontua o cabo, muitas vezes querem evitar divulgação por acharem que atrairia holofotes. "A gente fala: 'Olha, desaparecimento não é crime, pode ter acontecido alguma coisa com a pessoa e, mesmo assim, às vezes não autorizam a divulgar", diz.
Outra colaboração preciosa para a equipe é o Ministério Público do Trabalho. "A gente sempre fica ligada na lista de pessoas em trabalho escravo. É um leque de situações que você tem que cobrir. A tecnologia ajuda muito, principalmente a câmera de reconhecimento facial. Toda pessoa que desaparece a gente coloca no cadastro da câmera, em certo perímetro. Quando ela cruza, a câmera identifica, mesmo que tenha sido há duas semanas atrás."
Em sua rápida fala ao microfone, a comandante Elza Paulina da Guarda Civil Metropolitana (GCM) pontuou que, em um mês de funcionamento das câmeras de reconhecimento facial do sistema Smart Sampa identificaram 11 desaparecidos. A comandante já foi secretária municipal de Segurança Urbana.
Fonte: Movimento Mães da Sé, Agência Brasil
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