Relações Étnico-Raciais em Educação Física é o título do livro que está em pré-lançamento. A ideia é dar contribuição para a "transformação social" e oferecer "estratégias pedagógicas no auxílio da reeducação dessas relações." Espera que a escola cumpra com a própria essência modificadora "em prol de uma educação antirracista."
N. Há referências que denunciam racismo explícito ou velado? Conte algumas.
Francine. Enquanto professora, já presenciei muitas situações de racismo, explícito e velado, no ambiente escolar e inclusive nas minhas próprias aulas. Ao fazer uma roda de mãos dadas, por exemplo. Aconteceu diversas vezes, de algum estudante, na maioria das vezes negro, não ter para quem dar a mão.
Numa outra ocasião (que não foi a única), durante jogo, um estudante chamou o outro, que era negro, de macaco. Chamei os dois para uma conversa na qual o estudante que foi chamado de macaco respondeu que não se importava com o "apelido" e até ria com isso, pois era uma "brincadeira".
Eu sabia que aquele estudante estava aceitando a ideia de inferioridade atribuída a sua cor, como forma de proteção para não se expor ainda mais. Sabia que ele aceitava passivamente o tratamento pejorativo, incorporando a depreciação da sua imagem, porque, infelizmente isso está naturalizado na nossa sociedade.
Essas situações na relação entre os estudantes aconteciam no cotidiano das aulas. Um bom exemplo é quando durante as aulas de dança ou capoeira, são utilizadas músicas com instrumentos de percussão acentuados. Basta soarem os primeiros acordes para que alguém grite: "parece macumba, professora!." É fala de maneira pejorativa. Isso já aconteceu inúmeras vezes; arrisco até em dizer que não teve única vez em que eu tenha usado esse tipo de música e esse comentário não tenha aparecido.
N. Como sugere que esse grave comportamento humano seja superado no ambiente escolar?
Francine. A escola tem um papel preponderante na educação das relações étnico-raciais, por ser um espaço privilegiado de análise e produção de conhecimento, através do qual os preconceitos podem ser superados.
Pensar em uma resolução para essa realidade requer, em primeiro lugar, falar abertamente sobre ela, para que seja tirada a invisibilidade. É preciso criar estratégias pedagógicas no auxílio da reeducação dessas relações, para que a escola cumpra seu papel e contribua com a sociedade em geral, ao manifestar a possibilidade de transformação social das relações étnico-raciais.
Estudos mostram que é urgente olhar para a formação inicial e continuada dos professores. Os docentes querem e precisam receber formações específicas em suas áreas e nas questões relacionadas à diversidade étnico-racial e à prática antirracista. Deste modo podem mediar essa discussão sem medos ou insegurança.
N. Estatísticas que indiquem existência de segregação.
Sobre a autora
Francine Cruz nasceu em Curitiba, em 1984. Escritora e professora, licenciada em Educação Física, mestre e doutoranda em Educação (UFPR). É autora, entre outros, dos livros Atividade Física para Idosos: Apontamentos Teóricos e Propostas de Atividades (2008) e Educação Física na Terceira Idade: Teoria e Prática (2013).
Em 2012 recebeu o prêmio Agente Jovem de Cultura do Ministério da Cultura.
Francine Cruz é professora de Educação Física na rede estadual do Paraná desde 2012, especialista em Educação das Relações Étnico-Raciais.
Atualmente trabalha como técnica pedagógica de Educação Física no Departamento de Desenvolvimento Curricular da Secretaria de Educação do Paraná.
Fonte: Francine Cruz
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